segunda-feira, 21 de junho de 2010

O pedido


O dia dos namorados passara, mas Júlia continuava vivendo aquele momentos todos os dias, às vezes mais de uma vez por dia. Mas suas lembranças não traziam a beleza e o romantismo que em geral acompanham o 12 de junho, e era esse o motivo de sua tristeza.

Ela vivia um clichê, e apesar de já ter lido e visto muita coisa sobre o assunto, simplesmente não conseguia lidar com a situação. Fernando era seu amigo, desde que ela se mudara de escola no Ensino Médio, ela nunca se esqueceria de como ele foi gentil e a ajudou na adaptação com a escola e as pessoas novas. Agora ela já estavam no 3° perído da faculdade, e para todos os efeitos, ainda eram amigos. Mas, obviamente, não para Júlia. Ela nunca o vira como amigo, e também nunca teve a coragem de dizer o contrário, nunca se declarou, nunca contou a ninguém. Ela sabia que se dissesse que amava um amigo em segredo, o conselho seria contar a ele, talvez ele sentisse o mesmo, muitas histórias lindas surgiam de grandes amizades, todas aquelas coisas que todo mundo sempre diz, inclusive ela. Mas o seu caso era bem mais complicado. Ele estava interessado em outra pessoa, jamais teria olhos pra uma amiga.

Ainda com uma terceira pessoa protagonizando uma história que poderia ser dela, poderia existir uma chance, nunca se sabe, a esperança é a última que morre. Não, não haveria chance pra ela. Fernando namorava Ana, sua irmã gêmea. Logo que se mudaram pra escola nova, ambas se apaixonaram por aquele moreno tão lido e simpático, mas o coração dele bateu mais forte por apenas uma delas. Apesar de gêmeas, as irmãs eram totalmente diferentes. Júlia gostava de música e cinema, era caseira e tímida, enquanto Ana gostava de festas e era totalmente desenrolada. Além disso Júlia mantinha a cor negra original dos cabelos, sempre longos e com uma franja jogada para o lado, já Ana tinha os cabelos tingidos de um forte vermelho e usava bem curto, num estilo meio rebelde. E com todas as diferenças que tinham, elas se davam muito bem, eram companheiras, se amava e se defendiam. E era por isso que Júlia nada pôde dizer quando depois de uma semana de aulas confessou que tinha ficado com o Fernando, e que estavam apaixonados. A irmã estava feliz como há muito não estivera, e ela não teria coragem de destruir aquele sorriso, mesmo que isso custasse o seu próprio. Ela acreditava que o então amor proibido iria passar, que tudo ficaria bem novamente.

Ela não tinha noção de quão errada estava. Todos os dias, quando via o casal tão apaixonado, sentia raiva e ciúmes, queria estar no lugar da irmã. No mesmo instante, começava a se sentir culpada, como poderia se sentir triste quando via tanta felicidade? Tudo isso amargava dentro de seu coração e a impedia de ao menos tentar se apaixonar novamente, ficando sempre a margem de uma história impossível. Era ela quem aconselhava tanto a irmã quanto o Fernando, ajudava nas escolhas de presentes, era o mensageiro dos pedidos de desculpas e quem ouvia as juras de amor. Ela passava por tudo e sempre mostrava um sorriso, nunca fora capaz de dar um conselho ruim, de contar uma mentira, de tentar destruir o namoro dos dois. Apesar do que sentia, era sua irmã e seu melhor amigo, ela os amava, queria que fossem felizes, e lutava para ignorar aquela vozinha que lhe dizia que nunca se sabia o dia de amanhã e que se ele ficasse livre era ela quem estaria ali para servir de consolo.

Tudo mudou um pouco antes do dia dos namorados, os dois já tinham 4 anos de namoro, tudo parecia muito bem. Ana chegou em casa abalada, disse que não aguentava mais esconder, precisava falar pra alguém ou acabaria explodindo. Júlia ficou sem fala quando ouviu que a irmã estava tendo um caso com outro homem. Era a primeira vez que ela via desonestidade na relação dos dois, e ela não sabia o que fazer. Não sabia se deveria se calar em apoio a irmã ou contar a verdade ao seu melhor amigo. Felizmente, Ana se mostrou arrependida, disse que terminaria tudo com o outro, mas isso não mudava o que tinha acontecido, tudo estava confuso, tudo parecia mudar. Júlia pensou bem, deixou de lado o amor que sentia pelo amigo, e ficou quieta, era melhor os dois se resolverem, ela não tinha nada que interferir. Se alguém tinha de contar seria a irmã, a decisão era só dela.

Não foi necessária a ajuda de Júlia para que Fernando descobrisse o que acontecia tão perto dele. Caio, o outro, não aceitou a separação, e como não tinha nada a perder, contou tudo pra Fernando, mesmo que isso não trouxesse a Ana de volta, pelo menos ela não ficaria com o homem que amava. Júlia pensou que seria o fim de tudo, uma traição assim era complicada. Deveria ela ficar feliz ou arrasada? Teria ela chance com ele depois disso? Teria ela coragem de tentar? Será que ele a amaria? Será que a irmã a perdoaria?

Tantas perguntas sem nenhuma resposta. Tantas vontades, nenhuma certeza. Ela se aquietou, resolveu tentar não pensar nisso tudo pra variar, deixar a vida seguir seu rumo natural, esperar pelo que o destino reservasse para ela. Foi exatamente o que ela fez, e o destino mostrou os seus planos, doces e cruéis ao mesmo tempo. Fernando ligou pra ela, disse que precisava vê-la com urgência, falar de um assunto que ha muito tempo gostaria de falar, mas nunca tivera coragem. Por mais que ela tentasse, não conseguia tirar aquele calor no coração bem típico do nascer de uma esperança, e ansiedade não conseguia parar de crescer.

Quando chegou no lugar combinado, o coração dela parecia que tinha vontade própria, ela tinha certeza de que as pessoas conseguiam ouvi-lo batendo quase como um tambor. E então ele disse o motivo de pedir para ela encontrar com ele. Fernando estava disposto a perdoar tudo o que a Ana fizera, queria a ajuda de Júlia para comprar um anel de noivado, e queria também que fosse sua madrinha.

Tudo que aconteceu depois daquilo foi um borrão. Ele fez o pedido no dia dos namorados, Ana aceitou, tudo estava definitivamente acabado. Ela seria madrinha e testemunha daquela história feliz, entre duas pessoas que amava demais,que jamais seria sua.

Yara Lopes

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