domingo, 31 de outubro de 2010

Choppada ECO


Bom, o tema já foi discutido e redescutido por todos, mas não poderia deixar de escrever sobre essa noite épica na vida dos queridos estudantes da ECO(pra quem não estuda com a gente na melhor faculdade de comunicação, só posso lamentar) que trouxe na manhã seguinte uma grande ressaca moral. Pode atirar a primeira pedra quem não teve a sua. Então, já que as fotos ainda estão pra sair e geral já espalhou tudo no twitter, ninguém vai reclamar se eu falar um pouquinho das coisas que pude ver por lá, uma das vantagens de permanecer sóbria do início ao fim da festa. Logo que chegamos a Praia Vermelha, ainda não tinha tanta gente, nem estavam servindo bebida, as coisas estavam bem tranquilas. Até achei que isso de que a choppada era o máximo, que várias coisas aconteciam e que valia muito a pena fosse mito, um amigo meu compartilhava dessa opinião, achava que ia ser fraquinha.

Mas as coisas começaram a esquentar bem mais rápido do que imaginávamos, as pessoas foram com muita sede ao pote- na verdade á cervaja, ao gummy, á tequila... E aí coisas engraçadas começam a acontecer: o menino que não consegue ficar em pé e me fala várias coisas estranhas, uma amiguinha que nunca bebeu e decidiu ficar louca na choppada, um veterano dançando sozinho meio isolado perto das caixas de som e um amigo que ficou felizinho e me fez entrar naquela água poluída. É claro que várias pérolas apareceram, um bando de gente bêbada junta, não era pra outra. Declarações de amor "pra sempre" reinou, na verdade, naquele dia tudo era "pra sempre". Era no nível "Você é meu melhor amigo pra sempre", "O nosso grupo vai ser unido pra sempre" e até "Poderíamos continuar assim ficando, na ECO, pra sempre" . Todos eram amigos, todos se amavam, todos eram muito felizes.
Outra frase memorável? "Cadê o Eric?". Era a pergunta que não queria calar. Enfim, ele aparece, e faz a felicidade geral dos amiguinhos calouros, não só pela sua ilustre presença dele, mas por ganhar uma Vodka na rifa e começar a embebedar todo mundo ainda mais, se é que isso era possível. E aí teve gente que precisou afirmar "Eu sou heterossexuaaaaaal" e "Eu amo a minha namorada", além de outros que tinham certeza de que estávamos no Iraque. É, que fase.

Tivemos algumas revelações, umas mais contrangedoras, outras extremamente constragedoras, seguidas de meninos dando fora porque seu coração pertencia a outra dama- é, ele fez questão de deixar isso claro pra todas as pessoas presentes. Além da peninha de um cara que ficou perseguindo a menina a noite inteira, mas ela conseguia fugir sempre. Me lembro das pessoas me perguntando se eu estava bem, porque eu estava mega feliz- o que é o meu estado normal, sem precisar de alcool na minha corrente sanguínea- e quando se convenciam de que eu estava bem, me pediam encarecidamente pra eu cuidar delas, não deixarem passar muita vergonha e não deixaram falar bobeira pra mãe quando ligassem pra ela. Eu tive êxito em alguns casos, fiquei correndo pela praia igual a uma maluca pra me certificar de que todos estavam, bem, tendo inclusive que invadir a tenda de bebidas e tirar um bêbado maluco que achava ter condições de servir as pessoas, mas só sabia derramar cerveja nelas e beber o que restava nas latas. É, fora o que pra mim foi o caso clímax: uma menina agarra um menino de forma muuuito aleatória, sendo que esse já tinha jogado uma terceira na areia anteriormente, a qual presenciou a cena de agarramento posterior. É, foi mesmo uma barra.


Mas nem só de vergonha se faz uma choppada. Casais se desenrolaram, amizades foram feitas, tocou "I got a feeling" e todo mundo se abraçou - apesar de muita gente não se lembrar disso- e o must foi quando começou a tocar "Pra te enlouquecer, pra te enlouquecer..." e aí os calouros de fato enlouqueceram. Só faltou tocar "Sou rycah" e "Época das carroças" pra ser sucesso total. Rimos muito, conversamos, dançamos, aproveitamos o nosso momento, celebramos a nossa entrada nessa faculdade maravilhosa, com pessoas muito, muito legais. Os vexames, as ressacas, o corpo cheio de areia, os pertences perdidos e o medo das fotos que estão pra sair são apenas detalhes que deixaram o acontecimento ainda mais emocionante. Nada paga ouvir as histórias do dia seguinte das pessoas no Laguinho, contar pra elas o que elas disseram e ver a cara de espanto quando elas não se lembram, dividir os melhores momentos e as melhores frases, estar junto de amigos, que já estão no seu coração e que continuarão na sua vida por tempo indefinido, que eu espero significar eternamente.

E pra deixar todo mundo ainda mais feliz, Festa dos Calouros está chegando. Com mais momentos felizes, mais amores "pra sempre", mais memórias perdidas, mais desenrolos, amizades, risadas e dias seguintes.

O que eu tirei de tudo isso é que a ECO é muito legal, pessoas podem ser muito engraçadas, a bebida tende a mostrar o que a pessoa de fato é e você não precisa fazer coisas erradas pra se divertir- você pode simplesmente olhar os outros fazendo e rir muito, porque tem sempre alguém que faz. Choppada da ECO desse semestre? Poxa, que fase.

Yara Lopes

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Um desabafo


Esse é um texto de revolta, confesso. Não é a minha intenção contaminar ninguém com o meu estresse ou a minha raiva, mas eu gosto de externar as coisas que eu penso e que eu sinto, e hoje mais do que nunca eu precisava colocar esse turbilhões de coisas que estão me atormentando. Às vezes a gente acorda estressado, irritado, quer gritar com o mundo. Não dá vontade de sair da cama, não queremos ver ninguém, não queremos conversar, não existe nada que seja bom. Sim, pode parecer o contrário na hora, mas o problema é com a gente e não com o resto do mundo. E é complicado, porque as coisas não param simplesmente porque você acordou sem vontade, o trabalho continua lá te esperando, a faculdade não vai sair do lugar, a casa precisa ser arrumada, você vai ter que falar com as pessoas e elas falarão com você, porque o mundo continua girando, em torno do sol, não da gente. E é isso que parece causar mais irritação.

Nesses dias começamos a perceber a inutilidade das convenções sociais, por exemplo, por que temos que falar bom dia, contar do que aconteceu com a gente, ouvir o que aconteceu na vida das pessoas e ainda sorrir quando não sente a mínima vontade de fazê-lo? Na verdade, não há a mínima vontade de fazer coisa alguma, não existe nada que consiga fazer tudo isso passar. Tem que esperar o tempo passar.
E sim, é isso que eu sinto agora. Não só hoje, tem sido em geral uma semana ruim, e eu não sei bem a razão, talvez porque não haja uma em especial. Simplesmente não tem nada que me agrade, não tenho vontade de conversar, não quero assistir aulas, não quero ver o mundo. Hoje foi o pior desses dias ruins. Eu quebrei todas as regras. Ouvi a música que não poderia ouvir, e aí comecei a ver as fotos que já deveriam ter sido apagadas não só do meu computador, mas da minha vida. E chorei. Chorei pelas coisas de que me lembrei, por saudades do que eu tive, por vontade de voltar no fim de semana que eu fui tão feliz que achei que ia explodir, por querer ter o poder de escolha nas minhas mãos, por querer ter alguém do meu lado que faria toda a diferença do mundo. E eu gritei, até assustar os vizinhos. Gritei pela raiva de ter perdido o que foi tão meu, por ter raiva de ter perdido, por ainda me lembrar, por ainda desejar, por ter estagnado, por ter regredido. E aí vem a dor. Tão forte que queria arrancar um pedaço de mim mesma, quer queria bater em alguém com muita força, pra ver se aliviava um pouco da minha própria dor, tão forte que eu já nem sentia mais, eu já havia me transformado na dor.

Fui pra faculdade e me arrependi de ter ido. Sou sempre sorridente, alegre e saltitante, e obviamente as pessoas achariam que eu estaria no meu estado normal, e por isso sorriram pra mim, falavam comigo, contavam suas coisas, mas tudo que eu queria era gritar e sair dali correndo. E foi por isso que não assisti a palestra de Artes, eu não ia conseguir ouvir aquele moço falando de fotografia alemã, quando eu estava tão, tão...nem sei a palavra que pode definir. Quando chegamos a esse estado, não adianta, temos que parar um pouco, tentar tirar isso que está fazendo mal. Então eu fiquei conversando com meu amiguinho, e foi bom, chegamos a várias conclusões numa conversa mega viajante. Percebemos que sentar no chão ajuda a pensar, que faltar uma palestra de fotografia não é o fim do mundo, que é por momentos estressantes como esse que as pessoas bebem, que ignorar e fazer ciúmes são técnicas de sedução, que quando não se tem nada vale a pena arriscar, que se essa pessoa não te quer tem várias outras querendo, que muita gente fica em função de atrapalhar sua vida, que amigos virtuais podem ser mais fieis que amigos reais, que a vida é muito complicada, que sorrir nem sempre é uma coisa legal e que ter um amigo com quem tirar essas conclusões não tem preço.

Passado esse momento filosófico, percebi que havia uma outra coisa que estava causando a minha raiva. Na verdade, mais uma pessoa. E aí toda a raiva, a decepção, o incômodo que ela me fez passar veio de uma vez, e eu decidi que chega. Pra que continuar tentando ser cordial e boazinha com quem não faz o mesmo por você? Pra que continuar com algo que não mais te faz bem? E minha vontade de gritar e socar veio ainda mais forte. Percebi que aulas de boxe não seria uma má ideia na minha vida, pelo menos funciona nessas horas. Conclui que ignorar não é só técnica de sedução, pode ser tapa de luva, também. A essa altura do campeonato, ainda tive que juntar toda a paciência para ver duas aulas, mas que foram interessantes, consegui esquecer da minha raiva. Se concentrar em coisas complicadas é bom pra esquecer momentâneamente os problemas, alivia um pouco.

Cheguei em casa irritada, ainda bem que minha amiguinha divididora de lar é muito compreensiva e me ouviu reclamar, ainda não sei como ela conseguiu, porque nem eu estou aguentando o meu mau humor, e com certeza ninguém vai ler isso, não teriam paciência, mas estou num momento que nem ligo,não estou ligando nem pra mim mesma, não estou ligando pra nada. Hoje eu só quero ficar quietinha e tentar afastar de mim tudo que me faz ficar assim tão diferente e chateada. Quero manter as coisas boas, pra acordar amanhã e ver como o Rio de Janeiro é bonito, chegar na faculdade feliz, sorrir pras pessoas, ver graça nas coisas. Enquanto isso eu continuo com o meu mau humor e azedume. Tenho que parar de remoer as coisas,isso é um fato.
Yara Lopes

terça-feira, 12 de outubro de 2010

Fragmentos do espelho


Há alguns dias atrás eu tive um pequeno problema, passei mal na faculdade, fiquei meio dependente das pessoas me ajudarem. Apesar da dor que eu sentir e da problemada que causou pra todo mundo, foi um experiência muito interessante, me deu muitas coisas pra pensar. O Felipe logo me acodiu e mobilizou tanto pessoinhas da outra turma quanto uma das meninas qe mora comigo, ou seja, fez aquela confusão e eu fiquei morrendo de vergonha. Mas foi tão lindo, ver ele todo preocupado, ligando pras pessoas, me perguntando se eu estava bem, que remédio eu queria tomar e tudo mais, e o mais fofo de tudo foi ver as pessoas que ele estava chamando chegando, preocupadas comigo. Ficaram comigo o tempo todo, brigando pra me levar pro hospital(que eu não deixei, é claro), pegando na minha mão, me dando o ombro pra encostar, me chamando pra ir pra casa, me carregando nos braços até o táxi, comprando remédios, fazendo comida... Minha mamãe ficou super preocupada, achando que eu estava quase em perigo, doente e abandonada, mas foi totalmente o contrário. Eu me senti protegida, cuidada, em casa mesmo. E foi isso que me fez refletir sobre quem são as pessoas que estão mesmo ao seu lado, sobre como é demonstrado o amor e o que é um lar. Eu sinceramente tinha uma impressão mais negativa de cidade grande, até porque eu venho do interior, onde as pessoas todas se conhecem, os pais conhecem uns aos outros, onde você vai ao supermercado e a gerente pergunta se sua avó voltou de viagem. Aqui no Rio eu sabia que não teria nada disso, as pessoas não seriam minhas amigas logo de cara, você não deve sair sorrindo e abraçando todo mundo e nem dando bom dias(deu pra ver as caras estranhas quando eu fazia isso, até hoje o cara da banca de jornal deve achar que eu tenho probleminhas). Mas isso acabou fazendo com que eu pensasse que nesse lugar as pessoas eram de fato frias, só se importavam consigo mesmas e que eu não teria fortes laços. Morria de medo do que aconteceria se eu passasse mal aqui, quem iria cuidar de mim? Sem mamãe, sem papai, sem meus irmãos e sem minha melhoramigavizinhairmãamoreterno? Eu tinha medo de precisar de pessoas, olhar para todos os lados e não encontrar ninguém. Eu tinha medo de não encontrar calor humano, de ficar sozinha. Mas eu percebi que na vida, não precisa ser tudo 8 ou 80. Sim, existe intermediário mesmo quando não se parece, mesmo quando não se consegue explicar direito, ou demonstrar. As pessoas não precisam me abraçar o tempo inteiro e nem saber detalhes da família pra serem amigas e se preocuparem. Pessoas são diferentes, os lugares trazem costumes e modos de viver que muitas vezes chocam bastante, mas não é isso que vai mudar o sentimento, não é isso que vai impedir a criação de afeto, e isso é muito, muito maravilhoso. Nos lugares mais improváveis pode ser encontrado o que você mais procura, você acaba se identificando mais com pessoas que acabou de conhecer do que com outras com quem viveu a vida inteira, de uma hora pra outra enxergamos o que de fato nos completa, onde está o que pode nos fazer feliz. E esse lugar feliz não precisa ser aquele de sempre, familiar, fácil e confortável. Pode ser um ambiente ainda meio estranho, inexplorado, desconhecido e nada familiar, mas ainda assim com uma instantânea e mágica conexão com o seu interior. É como olhar pro outro e se reconhecer ali, como se antes você se olhasse num espelho embaçado e não reparava em todos os seus detalhes, até olhar pra esse espelho alternativo que é essa situação toda nova e ver um pedaço seu refletido, uma parte que talvez antes não tivesse sido descoberta, talvez não fosse tão importante, mas que agora faz toda a diferença. Estou tentando ver melhor esses meus detalhes que eu não estava enxergando no meu espelho embaçado do passado. Na verdade, estou vendo que meu espelho estava completamente sujo e distorcia um pouco o que eu achava que eu era, a imagem que era mostrada pra mim de mim mesma. E estou gostando do que estou vendo. Encontrei mais sentimento, mais espontaneidade, criatividade, humor e até inovação. Eu pensei que estava me recriando diante da situação nova, me adaptando ao lugar e ás pessoas. Estava errada. O tempo todo eu só estava deixando vir a tona o que já existia dentro de mim, eu estava limpando o meu espelho e mostrando um "eu" bem mais completo, mais real, que nem eu mesma conhecia. E foram essas pessoas que eu julgava frias e descompromissadas que me ajudaram a me ver melhor, foram elas que me deram apoio quando eu fraquejei, que riram comigo num momento engraçado, que me deram e me pediram um ombro pra chorar. Eu aprendi a confiar nessas pessoas e a ser uma confidente, eu me deixei fazer parte de um todo e esse todo já é parte de mim também. Rimos, choramos, passeamos, cozinhamos, conversamos, dormimos, ensinamos, brigamos, amamos, descobrimos, somos. Tudo muda e permanece quando simplesmente nos permitimos. Viver, experimentar, conhecer, ser. Criamos memórias que vão se costurando e formando um quadro bonito diante dos nossos olhos, algo que só tende a crescer que nos dá possibilidades. Cresceremos, venceremos, sonharemos, aprenderemos, teremos, seremos. Nada pode ser agora sem ter sido alguma coisa antes, sem poder ser num futuro. Tudo que existe agora teve um fiozinho que criou no passado e vai repercutir no futuro. E são pessas, lugares, momentos, atitudes e escolhas que vão formar e ter a chance de transformar tudo isso. Pro que foi, pro que é, pro que será. Estranhos se tornam família, uma selva se torna um lar. Eu sei, você deve estar lendo tudo isso e não entendendo nada, achando que nada fez sentido e que eu sou louca. É, talvez nada disso faça sentido mesmo, mas talvez faça. Talvez o mundo não faça sentido. Eu posso ser confusa, posso ser meio louca, posso ser estranha. Mas tenho tentado ser honesta comigo mesma, quero me descobrir. E nesse caminho encontrei muitas pessoas bem diferentes de mim, mas que de certa forma, eram fragmentos do meu espelho e me ajudaram a ver.

Yara Lopes

terça-feira, 5 de outubro de 2010

O que parece


Às vezes achamos que estamos prontos para as coisas, que somos maduros o suficiente pra dar o próximo passo, que teremos responsabilidade pra arcar com as consequências, que aceitaremos tudo aquilo em nome do crescimento pessoal, que não olharemos pra trás. Em boa parte das vezes não é bem isso que acontece, nos sentimos pequenos e fracos pra carregar uma carga tão pesada, suplicamos em segredo que alguém apareça e ofereça ajuda, temos vontade de voltar para aquele momento feliz em que tudo era mais fácil, queremos um colo, um consolo.
Mas o tempo trás oportunidades, escolhas e obrigações, temos de caminhar, precisamos seguir adiante. Quando passei no vestibular da UFRJ achei que não poderia ser mais feliz, eu finalmente ia realizar um sonho, possivelmente o maior deles. Quem não pensaria que é a coisa mais maravilhosa do mundo? Passar na faculdade dos seus sonhos, pra fazer o curso dos seus sonhos, e ainda de bônus morar na Cidade Maravilhosa. Parecia mesmo que seria um conto de fadas, eu não pensei nem duas vezes na hora de cancelar a matrícula da UFF, voltar pra Bahia e esperar feliz pro próximo semestre. Assim fiz, esperei alguns meses e a hora chegou. Hora de me mudar mais uma vez. Não achei que começar a tirar minhas coisas do armário fossem me balançar tanto, a imagem das malas espalhadas pelo quarto, da minha mãe enchendo os olhos de lágrimas toda vez que passava na porta e olhava aquela confusão de roupas e caixas, do meu pai que sempre dava um sorriso que não conseguia chegar aos olhos, da minha melhor amiga pulando toda aquela bagunça pra ficar num cantinho apertado da minha cama dizendo que ia sentir saudades, tudo começava a borrar minha cabeça e pesar meu coração. Mas eu não iria desistir por isso, já tinha passado por isso duas vezes, já deveria estar mais forte, sentir menos. Um por um eu fui me despedindo das pessoas mais importantes da minha vida, deixando pra trás o conforto e familiaridade da minha cidade, indo embora de casa e deixando um pedaço de mim.
Mas eu acreditava que tinha um futuro cheio de sol, nuvens brancas e colorido, provas, trabalhos e professores complicados, vitórias, tropeços e claro, mais vitórias. Cheguei no Rio com milhares de bolsas e com mamãe do lado. Conheci meu novo apartamento e as meninas que iriam morar comigo, minha nova família. Eu me senti sortuda, adorei o lugar e me identifiquei com as três meninas imediatamente, sabia que Deus estava cuidando de mim. Mamãe ficou comigo por mais alguns dias, ajeitou minhas coisas aqui, me deixou com tudo pronto pra começar a seguir minha nova vida. Só quando ela entrou naquele táxi pra voltar pra Bahia que eu percebi o que estava acontecendo, eu a partir daquele momento estava de fato por minha conta, completamente sozinha, a mais de 1000 km de casa. A palavra sozinha ressoava na minha cabeça e não me deixava pensar direito. Eu percebi que estava chorando e que o porteiro me olhava meio assustado.
Logo logo comecei a ir pra faculdade, participei do trote, tive meu cabelo destruído e pedi dinheiro na rua. Conheci muita gente e fiz amigos muito mais do que fantásticos, não posso reclamar. A ECO é exatamente o que eu esperava, claro que tem seus defeitos, mas me senti satisfeita, gostei bastante da maioria dos professores, e comecei a me descabelar com a quantidade de xérox e de trabalhos, tudo dentro do esperado. Me habituei a andar de ônibus e não reconhecer as ruas direito, a ouvir o "s" puxado dos cariocas e a ver o riso das pessoas ao ouvir o meu suposto sotaque(eu ainda teimo que não tenho sotaque). Tudo parece ir bem, esse apartamento já tem jeito de minha casa e ouvir a voz de mamãe e papai toda noite pelo telefone me contando tudo que tem acontecido por lá virou um hábito bom. Tudo parece bem. Até que eu fique sozinha e permita minha mente pensar em coisas que não devia. E aí o que parecia firme e seguro desaba bem em cima da minha cabeça. Eu não estou tão pronta e tão madura quanto achei, e definitivamente começo a olhar pra trás. Me lembro da minha cama e do meu colchão que já tinha o formato do meu corpo, da cama enorme da mamãe e do papai que era suficiente pra nós três quando eu tinha um pesadelo, do café da manhã na cama que mamãe me trazia enquanto assistíamos o "Bom Dia Brasil", da UDI pronta pra qualquer coisa a qualquer hora, da minha sobrinha bebê fofa que me abraçava e dizia que me amava, de estar no quarto e ver minha melhor amiga entrando e me contando as novidades, do meu pai me trazendo açaí a noite, da minha irmã e do meu amigo me trazendo músicas novas, da mamãe contando tudo que vai acontecer nos filmes, da Dani musa superior cogitando comigo sempre. Eu sinto falta de casa, do meu lar, do meu aconchego. As coisas estão complicadas, e eu não tenho ninguém pra me abraçar e dizer que me ama, eu estou tendo pesadelos e não tenho a cama enorme com mamãe me abraçando, eu fico sentada no meu quarto e ninguém aparece repentinamente pra me ver. Eu ouço uma boa música e não tenho a pessoa certa pra cantar junto, eu vejo um jogo do Santos e não vejo o papai vibrando e soltando fogos, eu pinto as minhas unhas e aquela chatinha do meu coração não surge pedindo pra eu pintar as dela também, eu arrumo o quarto e não tem nenhum bebê pra destruir tudo e depois pedir desculpas forçadas com aquele sorriso lindo. Eu tenho uma situação e não tenho a pessoa pra me dar colo, passar a mão no meu cabelo e analisar tudinho frase por frase. Eu fico com raiva e não posso gritar bem alto até quase explodir, tenho uma dor de estômago e não tem o vovô pra fazer um chá de boldo, chega o sábado e não tem requeijão e nem biscoito da feira na mesa do café da manhã, eu vou na rua e não tem um bom acarajé, e da farinha não dá nem pra comentar. As pessoas não te dão bom dia, não sorriem se não te conhecem. Tudo é diferente.
Eu sei, sei que tenho que olhar pelo lado positivo. É o que eu faço e o que me impede de pegar minhas malas e aparecer em casa. Tenho pessoas muito maravilhosas ao meu lado aqui e daqui a dois dias mamãe chega trazendo um pouco da Bahia pra mim(leia-se acarajé, requeijão, farinha carne de sol, biscoito da feira e claro, muito amor). Só tenho que continuar olhando pra frente, manter a mente ocupada, tentar não olhar pra trás. Preciso acreditar que sou madura o suficiente, que consigo lidar com tudo isso. Preciso acreditar no sol, nas flores e no clorido, nas aulas, nas vitórias. É bom ver o Cristo e o bondinho quando se olha pro lado, dá uma coisa esquisita na barriga. E o principal, quem sabe um dia papai e mamãe estarão sentados tomando café na cama enorme vendo o "Bom Dia Brasil" comigo, mas eu estarei do outro lado da tela, é claro... É só focar nisso, e tudo volta a parecer bem.